quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Puxando as brasas para minha sardinha - Capítulo 1 e 2

Capítulo 1

No dia trinta de setembro pela manhã estive em uma clínica oftalmológica. Visita de rotina. Enquanto aguardava ser atendido, chamou-me a atenção a dificuldade que um idoso, que acompanhado da sua esposa, tiveram para responder às perguntas da atendente. O idoso indagava à atendente, cada vez mais alto, e a atendente teimosamente – não entendi por que –, falava mais baixo ainda. A antessala era pequena e chamou a atenção de todos que aguardavam a vez de serem chamadas. Fiquei bastante incomodado com o ocorrido. Com todos os meus sentidos mais aguçados, passei minha atenção, menos na atuação despreparada da funcionária e me foquei no casal de idosos: Eles estavam sós. Eles não podem ter vindo até aqui sozinhos – pensei –, alguém os deixaram à porta. Depois do “embate” com a atendente, uma segunda funcionária veio chamá-los, e lá se foram: A jovem à frente a passos largos teve que por várias vezes parar e esperar o caminhar lento do casal. O idoso um pouco mais forte emprestava carinhoso seu braço e o tempo que sua companheira necessitava para, arrastando os chinelos, vencerem a distância que os separavam da apressada guia –. Posso imaginar –, que aquele casal se dava um ao outro, como única âncora que lhe sobrara nesta vida. Aquela cena, do curvado casal chegando ao fim do corredor, se prestava ao epílogo de alguma obra literária barata e corriqueira e anunciaria “um fim a dois” não muito mais distante. Onde estariam quem os trouxeram aqui? Voltei meus sentidos novamente para a sala de espera, vi que como eu, a maioria dos que esperavam era de idosos e idosas, felizmente nem todos estavam desacompanhados.

 Outra coisa – talvez pela minha irritação –, passou a ter um peso maior sobre o meu ”domínio próprio” e me incomodava cada vez um pouco mais o fato de ouvir a médica sempre que chegava à porta do consultório e chamava alguém pelo nome, e assim que o tal se manifestava, ela com um sorriso profissional concluía: “Vem princesa...” e ouvi aquele bordão ser repetido ainda umas três ou quatro vezes até que ouvi o meu nome. Lá fui eu tenso, pedindo para não ouvir... Mas ouvi: “Entra príncipe. Confesso, me segurei, pois já estava premeditado e com a fala na ponta da língua; estou mais para sapo! Queria ter dito, mas agradeço a Deus por ter me contido, fiquei calado. Voltei para casa me sentindo um pouco mais velho. Nem o diagnóstico de que tudo estava bem com meus olhos, nem o fato de que só precisaria voltar ali daqui a seis meses, me fizeram ficar feliz. Mas essa história toda ficou aguçando uma dose de amargura, que não deveria ter nutrido; a de sentir pena de mim. Só experimentei alívio, quando narrei, ainda querendo dividir minha tristeza com minha esposa, na hora do nosso culto doméstico no final da tarde. De todos os nossos medos quanto ao futuro – com os olhos marejados –, concluímos: o maior é o da possibilidade de terminarmos sós. 
Por que esta história agora? Porque no dia seguinte, sábado, primeiro de outubro –, Deus é bom! – Sem nenhum aviso, escuto alguém chamar a todo volume e de forma muito alegre e em repetidas vezes o meu nome, lá em baixo do meu prédio sem usar a campainha. Por acaso eu estava no computador, ao lado da janela no terceiro andar, foi uma bela surpresa, um grupo bem grande de irmãos e irmãs da minha igreja. Recebi o grupo tentando não ficar para trás e busquei fazer tanto barulho quanto eles. A que eles vieram – pensei surpreso –, sem nenhum aviso? Que maravilha, que gostoso, um “bando” de meninos e meninas da UPA. Era, e eu nem podia imaginar, o DIA DO VOVÔ E DA VOVÓ. Foi o contraponto do meu dia anterior. Aqueles jovens irmãos e irmãs eram a igreja que não abandona seus velhos. Foi uma pena, que eles ficassem tão pouco, disseram que ainda havia vários outros vovôs e vovós a quem eles ainda iriam abraçar. Uma das meninas – linda! – solene leu para mim um texto em sua Bíblia, e oraram, e me felicitaram por Deus ter me agraciado com netos. Senti-me um ANCIÃO, com todas as bênçãos e implicações que este termo resume. Senti-me gostosamente amado. Como eu narrei, o grupo era composto só de meninas e meninos, entre eles não havia quem não pertencesse à UPA. Surpreendi-me, no entanto – pois havia escutado da oculista no dia anterior que tudo estava bem com meus olhos –, algo estava fora de foco, será que eu observei bem? – pensei –, entre os upanenses, ou upenses ou up... Sei lá como se fala, estavam dois meninos bem diferentes: um era meio barbudinho – barba branca –, e não conseguia esconder os dentes, ria feliz e simpático o tempo todo, o outro, era barrigudinho, careca e barulhento. Será que foram meus olhos. Vou ter que voltar na clínica. Sei não!

Vovô de Oliveira



Capítulo 2

O dia do idoso é comemorado no Brasil no dia primeiro de Outubro. A UPA (União Presbiteriana de Adolescentes), da nossa igreja, com o objetivo de valorizar os seus idosos, saiu acompanhada de alguns “outros jovens” – jovens sim! Como disse (Victor Hugo) –: “Quarenta anos é velhice para a juventude, e cinqüenta anos é juventude para a velhice”. Eles, além do carinho me deixaram um cartão dedicado ao Vô e à Vó. Fizeram-me um grande bem! No cartão eles citaram o Salmo 90:12 “Ensina – nos a contar os nossos dias, para que alcancemos coração sábio”.
Minha oração é que eles – os jovens e todos os já não tão jovens da IPB Tabuazeiro –, aprendam de verdade há contarem seus dias e alcancem corações sábios desde já e durante todos os dias, até que eles mesmos venham a receber visitas como todos os idosos que foram visitados e amados por eles naquele dia primeiro.
Todas as nossas famílias fatalmente como nossa igreja, possuem idosos – que muitos desavisados chamam velhos –. Prestem bem atenção! Falo como um septuagenário. A Igreja é muitas vezes o melhor lugar que vamos para não nos sentimos sozinhos. Não exigimos muito! Muitas vezes, basta-nos ser notado. E um abraço então!! Este é o mais negado. Às vezes até mesmo em família, quando os temos por perto. Muitos de nós vivemos a dois, muitos vivem sós. Outros estão sós mesmo que juntos em algum asilo qualquer. E o número de “velhos”, muito cuidado!!! Estão aumentannnnnndo.     
Segundo o Censo 2010, feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem cerca de 20 milhões de idosos, acima de 60 anos o que corresponde a aproximadamente 10% da população do país.  As Igrejas não devem orbitar longe desse percentual, quem sabe somos até mais que dez por cento? (Com a palavra o Diácono Celso Castro, nosso estatístico).
Estou relendo livro que me foi presenteando quando completei sessenta anos, e que recomendo a todos os irmãos, de todas as faixas etárias para ajudar na compreensão do que é ficar velho com sabedoria. Uma excelente leitura principalmente para os que derem ouvidos ao Salmo noventa, verso doze. (“Fui moço, agora sou velho e daí). Escrito pelo Pastor já jubilado, Kléos Magalhães Lenz César. Editora Ultimato 2002. Na página 82 ele cita um anônimo de coração aberto, que escreveu a um certo jovem:
“Se meu andar é hesitante, e minhas mãos trêmulas amparem-me. Se minha audição não é boa, e tenho de me esforçar para ouvir o que você está dizendo, procure entender-me. Se minha visão é imperfeita e o meu entendimento escasso, ajude-me com paciência. Se minha mão treme e derrubo comida na mesa ou no chão, por favor, não se irrite, tentei fazer o que pude. Se você me encontrar na rua, não faça de conta que não me viu. Pare para conversar comigo. Sinto-me só. Se você, na sua sensibilidade, me vir triste e só, simplesmente partilhe comigo um sorriso e seja solidário. Se lhe contei pela terceira vez a mesma história, num só dia, não me repreenda, simplesmente ouça-me, se me comporto como criança, cerque-me de carinho. Se estou doente e sendo um peso, não me abandone. Se estou com medo da morte e tento negá-lo, por favor, ajuda-me na preparação para o adeus”.
Por fim cito ainda o Pr. Kleos pagina 51, citando José Hermógenes: “Passa de meio-dia. O declínio começou, aqui, no vale, as sombras chegam mais cedo. Subirei a montanha. Lá no alto, os últimos fulgores do sol serão meus. e quando a noite chegar, vai me encontrar lá no alto”.

Vovô de Oliveira (Rômulo de Oliveira)

Um comentário:

  1. Vovo Romulo, sera que pelo menos este sapo lava o pe? Cuidado, pois vou cantar a musiquinha enh! Para terminar, realmente quero te dizer que vc e um Principe!!! Abraco, eu! ( grande que esta ficando pequeno)

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